O Sítio
Aquele velho projeto de fazer um fãzine com os amigos...


quinta-feira, fevereiro 24, 2005  

Menina de Ouro - Clint Eastwood

[NÃO LEIA SE NÃO VIU O FILME]

O filme é irrepreensível até a reviravolta. Somente essa primeira metade já mereceria muitos prêmios. A química entre Frankie e Maggie é incrível, nas lutas, nas viagens, num restaurante chulé de beira de estrada. São dois personagens perdidos na vida se encontrando e se ajudando. Afora os outros que orbitam em torno deles, elevando o fator verdade de uma história inóspita que se desenrola em ambiente completamente sombrio. Talvez o único porém dessa parte seja a representação um tanto maniqueísta da família de Maggie. Mas ok.

Já com relação à segunda parte do filme, eu tenho restrições mais pesadas. Li muito sobre a direção contida de Eastwood, mas acho que ele liberou a música e o close nas lágrimas em um par de ocasiões, e aquilo pareceu artificial. Pareceu um drama que a história não merecia. Além de uma representação ainda mais maniqueísta da família, quando novamente em cena.

Mas o problema mais sério não é nem esse, mas sim o fato do direcionamento da história ter deixado às claras a tese que o diretor ou roteirista ou autor do livro que deu origem ao roteiro quer provar: que uma pessoa deve ter o direito de escolher continuar vivendo, ou não. Com isso, Maggie deixa de ser a pessoa que acompanhamos com atenção na primeira metade para mostrar-se um esquema: antes, não tinha nada; apenas com sua força de vontade, conseguiu tudo (partindo daquela tese bem americana que Xuxa repetia: querer é poder, poder é conseguir); daí vem o destino e zapt!, tira tudo. Com isso tudo, ele consegue nos fazer acreditar que Maggie tem razão em querer morrer, abortando porém um grande personagem em favor de um instrumento ideológico.

Mesmo assim, uma grande qualidade da segunda metade foi manter e até amplificar o tom sombrio do filme. Se não se cumpriu a promessa de um grande filme sobre a vida daquelas pessoas, no lugar ficou um grande exemplar do cinema noir - com um pé fortemente fincado no gênero de horror - dos mais pesados e soturnos. Se conseguisse fazer isso mantendo a verdade intacta, teríamos outro clássico à Sobre Meninos e Lobos.

escrito por Chico Lacerda | 19:52 |


segunda-feira, fevereiro 21, 2005  

Sideways - Alexander Payne

O protagonista é do caralho, verdadeiro até dizer basta, nível Bob Harris e Charlotte (Encontros e Desencontros). O problema é que soltaram ele numa comédia artificial pacaralho, às vezes forçada, com alguns personagens legais (as duas mulheres, bem abaixo do protagonista, porém) e outro totalmente American Pie (o ator).

Então, tem ótimos momentos e outros em que dá uma raiva danada das escolhas de Alexander Payne. No final, as coisas boas ficam e o sentimento geral é positivo. O final final, depois do casamento, tem muito da melancolia legal de Eleição, o que é ótimo. A sequência em que ele vai ficando bêbado e querendo ligar pra a ex-esposa é um primor de edição. E a sequência do resgate da carteira, mesmo estando na seção pastelão do filme, é do caralho. A escolha por manter a câmera dentro do carro o tempo todo, na fuga, deu uma tensão daylight slasher movie da porra que me deixou besta.

escrito por Chico Lacerda | 10:35 |


quinta-feira, fevereiro 10, 2005  

Outro pra Fábio

"Bar ruim é lindo, bicho"
De Antonio Prata

Eu sou meio intelectual, meio de esquerda, por isso freqüento bares meio ruins. Não sei se você sabe, mas nós, meio intelectuais, meio de esquerda, nos julgamos a vanguarda do proletariado, há mais de 150 anos. (Deve ter alguma coisa de errado com uma vanguarda de mais de 150 anos, mas tudo bem). No bar ruim que ando freqüentando nas últimas semanas o proletariado é o Betão, garçom, que cumprimento com um tapinha nas costas acreditando resolver aí 500 anos de história. Nós, meio intelectuais, meio de esquerda, adoramos ficar "amigos" do garçom, com quem falamos sobre futebol enquanto nossos amigos não chegam para falarmos de literatura. "Ô Betão, traz mais uma pra gente", eu digo, com os cotovelos apoiados na mesa bamba de lata, e me sinto parte do Brasil.

Nós, meio intelectuais, meio de esquerda, adoramos fazer parte do Brasil, por isso vamos a bares ruins,que tem mais a cara do Brasil que os bares bons, onde se serve petit gateau e não tem frango à passarinho ou carne de sol com macaxeira que são os pratos tradicionais de nossa cozinha. Se bem que nós, meio intelectuais, quando convidamos uma moça para sair pela primeira vez, atacamos mais de petit gateau do que de frango à passarinho, porque a gente gosta do Brasil e tal, mas na hora do vamos ver uma europazinha bem que ajuda. A gente gosta do Brasil, mas muito bem diagramado. Não é qualquer Brasil. Assim como não é qualquer bar ruim. Tem que ser um bar ruim autêntico, um boteco, com mesa de lata, copo americano e, se tiver porção de carne de sol, a gente bate uma punheta ali mesmo.

Quando um de nós, meio intelectuais, meio de esquerda, descobre um novo bar ruim que nenhum outro meio intelectual, meio de esquerda freqüenta, não nos contemos: ligamos pra turma inteira de meio intelectuais, meio de esquerda e decretamos que aquele lá é o nosso novo bar ruim. Porque a gente acha que o bar ruim é autêntico e o bar bom não é, como eu já disse. O problema é que aos poucos o bar ruim vai se tornando cult, vai sendo freqüentado por vários meio intelectuais, meio de esquerda e universitárias mais ou menos gostosas. Até que uma hora sai na Vejinha como ponto freqüentado por artistas, cineastas e universitários e nesse ponto a gente já se sente
incomodado e quando chega no bar ruim e tá cheio de gente que não é nem meio intelectual, nem meio de esquerda e foi lá para ver se tem mesmo artistas, cineastas e universitários, a gente diz: eu gostava disso aqui antes, quando só vinha a minha turma de meio intelectuais, meio de esquerda, as universitárias mais ou menos gostosas e uns velhos bêbados que jogavam dominó. Porque nós, meio intelectuais, meio de esquerda, adoramos dizer que freqüentávamos o bar antes de ele ficar famoso, íamos a tal praia antes de ela encher de gente, ouvíamos a banda antes de tocar na MTV. Nós gostamos dos pobres que estavam na praia antes, uns pobres que sabem subir em coqueiro e usam sandália de couro, isso a gente acha lindo, mas a gente detesta os pobres que chegam depois, de Chevete e chinelo Rider. Esse pobre não, a gente gosta do pobre autêntico, do Brasil autêntico. E a gente abomina a Vejinha, abomina mesmo, acima de tudo.

Os donos dos bares ruins que a gente freqüenta se dividem em dois tipos: os que entendem a gente e os que não entendem. Os que entendem percebem qual é a nossa, mantém o bar autenticamente ruim, chamam uns primos do cunhado para tocar samba de roda toda sexta-feira, introduzem bolinho de bacalhau no cardápio e aumentam em 50% o preço de tudo. Eles sacam que nós, meio intelectuais, meio de esquerda, somos meio bem de vida e nos dispomos a pagar caro por aquilo que tem cara de barato. Os donos que não entendem qual é a nossa, diante da invasão, trocam as mesas de lata por umas de fórmica imitando mármore, azulejam a parede e põem um som estéreo tocando reggae. Aí eles se fodem, porque a gente odeia isso, a gente gosta, como já disse algumas vezes, é daquela coisa autêntica, tão brasileira, tão raiz.

Não pense que é fácil ser meio intelectual, meio de esquerda, no Brasil! Ainda mais porque a cada dia está mais difícil encontrar bares ruins do jeito que agente gosta, os pobres estão todos de chinelo Rider e a Vejinha sempre alerta, pronta para encher nossos bares ruins de gente jovem e bonita e a difundir o petit gateau pelos quatro cantos do globo. Para desespero dos meio intelectuais, meio de esquerda, como eu que, por questões ideológicas, preferem frango a passarinho e carne de sol com macaxeira (que é a mesma coisa que mandioca mas é como se diz lá no nordeste e nós, meio intelectuais, meio de esquerda, achamos que o nordeste é muito mais autêntico que o sudeste e preferimos esse termo, macaxeira, que é mais assim Câmara Cascudo, saca?).

- Ô Betão, vê um cachaça aqui pra mim. De Salinas quais que tem?

escrito por Chico Lacerda | 21:04 |


quarta-feira, fevereiro 09, 2005  

Carnaval pt. 1 - Anti-herói Americano

É o filme que retrata a vida do quadrinista Harvey Pekar. Na verdade ele não desenhava a arte final, só o argumento (com bonequinhos de palito) e dava pra amigos quadrinistas - Robert Crumb o mais célebre deles - desenharem. Publicou boa parte de seu material do mid 70s ao mid 80s. Fez um bocado de sucesso fugindo do estereótipo de quadrinhos de super-heróis e animais falantes, retratando, ao invés disso, com grandes doses de humor, cinosmo e melancolia, a si próprio e a todos que o cercavam, sem nem se dar ao trabalho de mudar os nomes reais. Uma vida normal de um arquivista de hospital deslocado e sozinho no mundo, com seus poucos altos e muito baixos. Os quadrinhos ganharam mais notoriedade do que fizeram sucesso.

O filme tentou (e, algumas vezes, conseguiu) fugir do padrão cinebiografia inserindo, em muitas partes, as próprias pessoas (Pekar, sua esposa, seus amigos do trabalho) retratadas, junto com os atores que os caracterizavam. Felizmente, essas partes estão bem misturadas a parte das dramatizações. Paul Giamatti, que faz o Pekar, está muito bem, fugindo dos tiques mais fáceis de um cara constantemente rabugento e com tendências depressivas. Mais pro final, o filme não conseguiu segurar bem a proposta, com duas grandes escorregadas: em primeiro lugar, fechou a dramatização com aquele ponto final padrão das cinebiografias: a situação estabiliza-se, as pessoas crescem e, mesmo sem se dizer, fica aquela cara de e eles foram felizes para sempre, na medida do possível; a segunda merda foi na parte final que usa as pessoas. Filmaram a despedida de Pekar do emprego, em razão da aposentadoria. A merda é que planejaram a coisa, os gestos, os abraços, ao invés de simplesmente filmarem a comemoração, e ficou na cara que era falso, que as pessoas reais estavam atuando.

Nos extras tem uma parte que a esposa de Pekar comenta algo do tipo, depois de assistir à estréia do filme: não sabia que a vida da gente era tão épica assim. Pois é, o filme rebolou com mise-en-scenes espertas e inserções dos representados, mas não conseguiu evitar a formatação da vida do cara naquela coisa meio épica, porém
não tão verdadeira. Apesar disso, saldo positivo, no geral.

escrito por Chico Lacerda | 13:01 |


quarta-feira, fevereiro 02, 2005  

Literatura Para Fábio Enquanto Júlia Não Volta

Jornal de Serviço
(leitura em diagonal das Páginas Amarelas)

I
Máquinas de lavar
Máquinas de lixar
Máquinas de furar
Máquinas de curvar
Máquinas de dobrar
Máquinas de engarrafar
Máquinas de empacotar
Máquinas de ensacar
Máquinas de assar
Máquinas de faturamento

II
Champanha por atacado
Artigos orientais
Institutos de beleza
Metais preciosos
Peleterias
Salões para banquetes e festas
Sondimentos e molhos
Botões a varejo
Roupas de aluguel
Tântalo

III
Panelas de pressão
Rolos compressores
Sistemas de segurança
Vigilância noturna
Vigilância industrial
Interruptores de circuito
Iscas
Encanadores
Alambrados
Supressão de ruídos

IV
Doenças da pele
Doenças do sangue
Doenças do sexo
Doenças vasculares
Doenças das senhoras
Doenças tropicais
Câncer
Doenças da velhice
Empresas funerárias
Coletores de resíduos

V
Papéis transparentes
Vidro fosco
Gelatina copiativa
Cursinhos
Amortecedores
Resfriamento de ar
Retificadores elétricos
Tesouras mecânicas
Ar comprimido
Cupim

VI
Mourões para cerca
Mudança de pianos
Relógios de igreja
Borboletas de passagem
Cata-ventos
Cintas abdominais
Produtos de porco
Peles cruas
Peixes ornamentais
Decalcomania

VII
Peritos em exame de documentos
Peritos em imposto de renda
Preparação de papéis de casamento
Representantes de papel e papelão
Detetives particulares
Tira-manchas
Limpa-fossas
Fogos de artifício
Sucos especiais
Ioga

VIII
Anéis de carvão
Anéis de formatura
Purpurina
Cogumelos
Extinção de pêlos
Presentes por atacado
Lantejoulas
Sereias
Souvenirs
Soda cáustica

IX
Retificação de eixos
Varreduras mecânicas
Expurgo de ambientes
Revólver para pintura
Pintores a pistola
Cimento armado
Guinchos
Intérpretes
Refugos
Sebo

- Carlos Drummond de Andrade

escrito por Chico Lacerda | 01:03 |


terça-feira, fevereiro 01, 2005  

O Clipe de Ladyflash









Muito tempo que eu não via um clipe pra casar tão do caralhamente com a música: Ladyflash, de The Go! Team. Baixem, vejam, dancem e comentem, seguindo o padrão dos últimos posts.

escrito por Chico Lacerda | 23:34 |
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