O Sítio
Aquele velho projeto de fazer um fãzine com os amigos...


sábado, maio 29, 2004  

O Desenhista

Depois de esculhambar uma pá de curtas pernambucanos, venho disponibilizar o meu recém terminado para esculhambação pública. Na verdade é mais uma brincadeira feita com meu irmão, aqui em casa, numa câmera fotográfica digital, pra sentir um pouco do gostinho do que é fazer um filme. O endereço pra download é o seguinte: http://users.hotlink.com.br/lfl/. O nome do arquivo é odesenhista.wmv. Divirtam-se.




escrito por Chico Lacerda | 00:29 |


terça-feira, maio 18, 2004  

5 Curtas Pernambucanos

Foram exibidos ontem na Fundaj os 5 curtas pernambucanos que participaram do Cine PE desse ano. Eu, que não tive oportunidade e/ou vontade de atender às sessões do famoso festival de cinema, aproveitei a ocasião. Foram eles:

Porcos Corpos - Sérgio Soares

Foi o primeiro curta a ser exibido. Pelo que eu entendi, e não entendi muito bem, conta a história dessa família de pai, mãe, filho e porcos, todos meio doidos, que moram nesse sítio miserável. A mãe sai pra pedir restos de galinha numa fábrica e o cara oferece um emprego pro filho dela. O filho começa a trabalhar e endoidar na fábrica, briga com o capataz, mata umas galinhas, tange outras e no final os porcos do sítio se juntam às galinhas. Fotografia bem bonita, sempre com tons cristalinos, principalmente nas cenas da fábrica. Atuações fracas e total falta de controle da narrativa (montagem e ritmo tronchos que só a porra). De bom teve a briga do capataz com o filho, com uma pezada que este último deu naquele que doeu até em mim; o cara se empolgou mesmo. Por sinal, quem faz o filho é Otto e, de acordo com os créditos, o argumento do filme também é dele. Tá explicado. :]

É Mais Fácil um Boi Voar - Marcílio Brandão

Pense naquelas vinhetas do governo fazendo propaganda do carnaval. Esse curta é uma delas, só que muito, muito pior. Pra começar, tem dezesseis minutos, que parecem mais de hora. Segundo, a falta de recursos salta aos olhos, com blocos de carnaval de meia dúzia de pessoas. Terceiro, as atuações passam longe do ruim padrão, são constrangedoras. Em quarto lugar, conta com a exaltação burra de sempre da "cultura pernambucana". É uma embolado de citações de Maurício de Nassau num Palácio do Campo das Princesas filmado sempre de baixo pra cima, pra esconder os prédios em volta, junto com um índio numa canoa, uma negra num tabuleiro de acarajé, um português com um sotaque português mezzo paraibano mezzo gay e um outro barbudo não sei de onde, todos falando frases sobre um boi voador; depois aparecem uns soldados vestidos de ku klux klan falando nonsense junto de umas tochas; aí tem uma misturada de cenas de carnaval paupérrimas e sem sentido aparente, e no final o boi voando amarrado num cordão e depois num helicóptero sobre o galo da madrugada. A pessoa que fez isso deveria ser forçada a aposentar-se da produção artística, qualquer que seja ela. Mereceu cada uma das vaias (e dos "merda!" proferidos por Mateus) que levou.

thelastnote.com - Léo Falcão

Seguindo o viés de seu curta anterior, Lugar Comum, Léo Falcão também neste se exime de fazer qualquer comentário ou ligação com regionalismos e cultura local, coisa que infelizmente é rara na produção daqui. Não que seja necessariamente ruim fazê-lo, não é, como poderemos ver no último curta da noite, mas se tornou regra desde não sei quando referenciar e reverenciar a cultura pernambucana - ou o que se impõe ser cultura pernambucana - sem qualquer posicionamento crítico ou estético. "Se é caboclinho, maracatu ou frevo tá ótimo e nem se atreva a falar mal" é o postura dominante e sempre é bom ver gente indo contra isso. O curta conta a história de um funcionário do site thelastnote.com, uma congregação de suicidas, que entra em contato com um dos filiados para cobrar-lhe o cumprimento do contrato através de seu suicídio. Atuação legal de Gustavo Falcão e sofrível de Lázaro Ramos. Que por sinal não sei como ainda é chamado pra fazer qualquer coisa, depois de uma única atuação decente (muito boa, na verdade) em Madame Satã e uma pá de coisas horrendas. Locações, fotografia, cenografia e montagem instigantes, com destaque pros créditos iniciais, simples, bem feitos e efetivos. O curta mantém uma velocidade boa com diálogos afiados e cínicos, mas deixa a bola cair no final, fechando/fechando-se com/como uma piada boba. Foi quase.

Ventilador - Leonardo Lacca

Campeão da noite, disparado. O curta tira uma onda pesada com a tendência dos próprios curtas em abordar (mal, na maioria das vezes) temas dramaticamente pesados e a larga (e má, na maioria das vezes) utilização de experimentalismos pelo formato. Pra não estragar a surpresa, vamos dizer que é a história de uma mulher muito deprimida e de uma câmera que se mexe pra lá e pra cá. Talvez se alongue um pouco demais - se acabasse durante o escracho central talvez surtisse mais efeito - mas é só uma suposição. Simples, inventivo, muito bom. O melhor da noite.

A História da Eternidade - Camilo Cavalcante

Como citei antes, esse aqui abraça o regionalismo e o que se passou a considerar cultura pernambucana. Segue, da mesma forma, a já citada tendência de curtas-metragens de se utilizar linguagem experimental (no sentido de fora do padrão). E se sai muito bem nas duas coisas. É um grande plano seqüência (com dois cortes escondidos por abrir e fechar de cortinas, pelo que pude perceber) passando por imagens surreais e extremamente simbólicas numa paisagem árida. Começa com um close no rosto de uma velha aflita, ao som de gritos de um parto. Passeia pelo parto, pelo feto que é atirado aos cachorros, por uma mesa de bar animada sob um negro crucificado, o enterro de uma velha que pode ser a que vimos em close, alguns pirralhos correndo e espiando uma mulher subjugada por um homem mais velho num estábulo, espia junto com eles O Grande Ditador num pequeno cinema, saindo dele com um velho que bebe Coca-cola entre lágrimas e depois depreda monitores de computador pelo meio do sertão, terminando numa TV mostrando o início do próprio curta enquanto um espectador tira a TV do ar e, consequentemente, o filme que vemos. Tecnicamente perfeito, com um cuidado especial na movimentação da câmera, sempre acompanhando o ritmo e o desenrolar dos acontecimentos. É um cinema muito mais sensorial do que narrativo, da mesma espécie de Lavoura Arcaica e 2001 - Uma Odisséia no Espaço mas bem mais simbólico. Foge de interpretações, mas abre um leque bem grande de possibilidades de, o que é bom. Ambicioso como os dois exemplos citados e da mesma forma bem sucedido em seu escopo. Muito bonito de se ver.

Teve um debate depois dos filmes, mas eu não fiquei.

escrito por Chico Lacerda | 21:42 |


quinta-feira, maio 13, 2004  

Algodão doce

Tinha certeza: fazer aquilo voar com um único sopro, era o que queria. E estava certa: era preciso alguma coisa voar. Já sabia que o vento corria. Entendia as correntes, os espaços e os movimentos. A consciência da leveza de todas as coisas tomava-lhe o pensamento. Construiu - com o vento - formas de ondas que não param, ondas que se misturam, atá não haver mais espaço que não fizesse parte de um pedaço de onda. E veio a convicção: o sopro faz voar.

E de tanto soprar, e de tanto achar que era leve, e de estar sempre tão certa, não tinha mais os pés tocando o chão. Não mais possuía a superfície. Mexia os pés, numa tentativa de alcançar o chão, mas já não era mais possível: subia cada vez mais.

Ergueu os braços às nuvens e aceitou a nova condição: nunca mais ninguém a viu.

escrito por Júlia | 12:41 |


sábado, maio 08, 2004  

Cartas

João estava sentado numa das poltronas da sala, seus olhos fixos no tapete, enquanto Lúcia folheava uma revista na outra. Ele estava pensando no que descobrira à tarde, no fundo da caixa de revistas velhas no quarto de despejo, enquanto procurava o antigo jornal com a notícia do incêndio e de seu heroísmo ao enfrentar as chamas para salvar um casal de velhinhos que morava no apartamento vizinho. Tinha uma foto sua ao lado da cama de hospital de dona Idalina. Havia lembrado do fato no dia anterior e passado a tarde do dia de hoje em busca do jornal, quase como uma necessidade.

Mas o que achara foram cartas, quase uma dúzia delas. Todas endereçadas a Lúcia, vindas de Foz de Iguaçu, remetente Carlos Anselmo dos Santos. Cartas de amor. E uma passagem de ônibus, para dali a oito dias, com destino a Foz do Iguaçu.

Fazia muito tempo que ele não lia cartas de amor, muito menos escrevia. Mas as havia escrito, muitas em sua juventude e algumas em sua idade adulta. Quase meia dúzia, num breve período de oito meses, treze anos atrás, endereçadas a Olga.

Conhecera Olga num congresso de medicina no Rio de Janeiro. Haviam saído junto com outros participantes, para almoços e pontos turísticos, e só no último dia é que permitiram-se ficar a sós: um passeio pelo Leblon, uma visita à exposição de Hopper e um jantar. No dia seguinte despediu-se dela no aeroporto com o coração pesado e voltou para o Recife, para Lúcia.

Ainda passara oito meses correspondendo-se com Olga. Era quando conseguia aliviar um pouco o peso. Mas não conseguiu tomar uma atitude, não poderia acabar o casamento com Lúcia, mandá-la de volta a casa dos pais de onde ela havia lutado tanto para sair. As cartas cessaram e ele queimou-as todas.

Passara perto de duas horas deitado na cama, vendo as sombras se alongarem do outro lado do quarto e pensando nas cartas – nas suas e nas dela – e na passagem. Finalmente, Lúcia voltara da escola. Jantaram em silêncio e agora ele tinha os olhos fixos no tapete enquanto ela folheava uma revista na outra poltrona.

escrito por Chico Lacerda | 19:42 |
escribas
arquivos
estatísticas