O Sítio
Aquele velho projeto de fazer um fãzine com os amigos...


sexta-feira, março 28, 2003  

Mais Livros à Venda

Mais uma vez estou colocando uma pá de livros meus à venda, mais os que não foram vendidos da vez passada. A maioria em perfeito estado de conservação. Mais detalhes, escrevam para lfl@hotlink.com.br. A lista está aqui: http://users.hotlink.com.br/lfl/livros2.html. Os que estão em fonte mais clara já foram reservados ou vendidos.

escrito por Chico Lacerda | 10:51 |
 

Adaptação – Spike Jonze (II)

A coisa mais legal que Spike Jonze criou foi a sua aceitação perante o público “alternativo”. Afinal, se você não gosta do último filme dele, isso é porque “o filme não é para todo mundo”. Dessa forma, não tive a sorte de estar dentre os felizardos para quem o filme foi destinado. O que é uma pena, porque eu vou ter que falar mal.

“Adaptação” é basicamente a história de um roteirista (Charlie) que tenta desesperadamente adaptar um livro sobre orquídeas para o cinema. Só que ele é um crítico ferrenho das fórmulas sydfieldianas de roteiro. Enquanto isso, seu irmão gêmeo (Donald) resolve seguir a mesma profissão, mas de forma radicalmente diferente, assumindo as tais fórmulas (ou princípios, como ele diz no filme) como pedra fundamental. Ao mesmo tempo que o primeiro encontra-se emperrado na sua tarefa, o segundo vai ganhando reconhecimento, mesmo que seu trabalho seja medíocre.

Charlie acaba, como era de se esperar, apelando para os conselhos do irmão e freqüentando as aulas de um certo professor McKee, que ensina justamente tudo aquilo que Charlie tanto abominava. Assim, a adaptação de Charlie acaba se tornando tão clichê quanto o roteiro do seu irmão.

Spike Jonze e cia. se acham muito espertos, muito criativos. Ele é o doidão de hollywood, como dizem no filme. E isso acaba fazendo com que a “originalidade” dele se torne previsível. A metáfora que vem à minha cabeça é a de um cachorro que antes de começar a tentar morder o próprio rabo, anuncia: “vou morder meu próprio rabo porque eu quero”, e usa isso como álibi para que a gente não ache aquilo estúpido.

Se há alguma coisa para ser elogiada no filme, é a atuação de Nicholas Cage. Não que seja algo digno de prêmio, mas é consideravelmente melhor do que ele costuma fazer. (Permitam-me um parêntese gonzo, mas eu considero Nicholas Cage um dos piores atores que já vi no cinema - o que faz com que um papel razoável dele signifique muito para mim. Seria mais ou menos como Irani marcando um gol de pênalti.)

Não me convenceu. Se até os 90 minutos era só um filme sem graça, a última meia hora é um tédio sem tamanho. Pelo menos tem a música do Turtles, que me fez sair do filme cantando.

Manda outro, Spike, porque esse não colou.

escrito por Haymone Neto | 02:44 |


quinta-feira, março 20, 2003  

Ervilhas

- Oi, eu... tudo bem? Olha, meu nome é Amanda e pode parecer estranho eu sentar aqui na sua mesa assim, do nada. Eu sempre almoço aqui e sempre te vejo almoçar aqui também.

Carlos sabia, já a tinha visto várias vezes. Olhos grandes, muito grandes, e curiosos. Atenta como uma criança, prestando mais atenção no que acontecia à sua volta do que no prato do qual comia.

- Eu gosto muito de olhar as pessoas, em todo lugar, não só aqui. Como elas agem. Você consegue aprender muito sobre elas só olhando. Você por exemplo, tem esse seu terno sempre impecavelmente limpo. Nunca vi um grãozinho de poeira nele. E nunca come as ervilhas da salada. Sempre as separa num cantinho do prato.

Olhou instintivamente para o prato, vazio. Não era dia de salada hoje. Olhou novamente para ela, confuso, os olhos grandes desinibidamente nele.

- E sempre te vi por aqui. Deve trabalhar por perto, né? Eu também, naquele prédio ali. Décimo segundo andar. Estágio em publicidade. Gosto muito de prestar atenção às pessoas e fui, de certa forma, me interessando por você. Não, nada como laboratório, olha que espécime interessante, vamos estudá-lo. Mas seu jeito metódico, de comer, de se servir. De olhar as outras pessoas, cautelosamente, temendo invadir-lhes o espaço... sei lá, você é diferente.

E tinha olhado para ela sorrateiramente diversas vezes em outros dias. Ela com seus olhos grandes e seu jeito sincero e desembaraçado. Ela era bonita, muito bonita, alva, muito alva. De cabelos castanhos curtos, lindos. Carlos adorava cabelos curtos. Ela era bonita e chamava atenção.

- E eu me peguei, algumas vezes, pensando em você. Em casa, no trabalho, pensando naquele cara do restaurante, aquele que dobrava o guardanapo depois que comia. Me perguntando: em que será que ele pensa enquanto come? Como será que ele dorme? Escova os dentes antes ou depois do café da manhã? Talvez antes e depois?

Ele corou ante esse comentário, sentiu o rosto quente. Acontecia com ele também. Havia várias vezes lembrado dela, imaginado aqueles seus olhos grandes e displiscentes, aquele jeito sincero. E se perguntado: será que ela fala com os vizinhos no elevador? Sai com as amigas depois trabalho? Será que leva os parceiros para casa? Ou vai até a casa deles? Mas isso era ele, era seu jeito de pensar bobeiras e fantasiar mais que tudo; nunca que pensaria que ela, aberta como era e provavelmente cheia de amigos e amantes e pretendentes a, perderia qualquer tanto de seu tempo pensando nele. Logo nele. Relutou em acreditar nisso.

- Aí eu pensei e pensei e pensei. E sabe de uma coisa? Vou chegar lá e falar. De que adianta ficar pensando, não é? Vou chegar lá e dizer tudo que venho pensando e como toda vez que o vejo tenho essa vontade de chegar e perguntar, e conhecer. De como parece que já o conheço mas sei que conheço nada. Que é só a cabeça imaginando e construindo um você aqui dentro. E eu vou te conhecendo sem te conhecer e quando te conhecer mesmo vou me frustrar porque você é diferente do que eu conheço de você aqui na minha cabeça, que não é nada no final das contas. Então, no lugar de ficar te conhecendo na minha cabeça, resolvi te conhecer aqui no restaurante mesmo.

Isso lembrava a Carlos dos tempos de escola, quando ele era ainda mais tímido e calado. Havia superado várias dificuldades, a sobrevivência o havia obrigado a isso. Já não sentia mais aquele comichão na barriga ao ter que abordar alguém que não conhecesse e até conseguia jogar conversa fora. É verdade que ainda tinha dificuldades de aprofundar qualquer relacionamento, mas estava tentando lidar com isso, lendo livros sobre o assunto, se informando. Já até cogitava, sem embaraço, entrar numa terapia. Isso era um avanço. Mas nos tempos da escola não. E sempre fora um dos alvos preferidos de chacota por causa disso. Principalmente das meninas, que se aproximavam com propostas e comentários indecentes, sempre para embaraçá-lo.

- Isso é alguma brincadeira? - perguntou, desconfiado.

- Olha, eu sei que é estranho. Eu tentei outras vezes tomar coragem e chegar e falar contigo, como achava que era o correto, mas nunca soube como fazer, como me aproximar, sempre esperando o momento certo ou a maneira certa. Não entendo nem gosto desses jogos de sedução que as pessoas jogam. Mas aí hoje... bem, meu estágio acabou, não renovaram. Me avisaram agorinha, de última hora, os filhos da puta – desculpa, não uso sempre essa linguagem - mas aí foi aquela coisa de limpe sua mesa e até mais ver. E agora nós almoçando de novo e eu não sei quando vou voltar por aqui, se é que vou e então pensei: o que que eu tenho a perder, né? No máximo vou fazer papel de atirada e levar um fora de alguém que eu provavelmente nunca mais vou ver, nada pior do que ficar imaginando o "e se". Você me imagina? Uma velhinha solitária num apartamentinho do centro conversando com as plantas e imaginando o que teria acontecido se eu tivesse ido falar com aquele moço do restaurante? Morro de medo dessas coisas.

Ele queria acreditar pois se sentia da mesma forma: dia após dia de observação contida o tinham levado a admirá-la, seu jeito aberto, tão diferente do dele. Mas é claro que não tinha mesma desenvoltura, nunca pensaria em se aproximar assim. Principalmente dela, tão diferente dele, tão... melhor que ele. E era esse o ponto, ele gostaria de se aproximar porque era ela, não ele. O que tinha de charmoso no jeito de ele comer, de dobrar o guardanapo? Nada. Absolutamente nada. E seu jeito acanhado, medroso? Daria tudo para ser menos assim. E aquelas meninas rindo dele no passado, depois de o terem embaraçado ou, pior, o envolvido na conversa delas, o terem feito acreditar que alguma delas estava realmente interessada nele. Isso tudo pesava e tornava esse monólogo quase surreal. Não, tinha que haver algo por trás disso.

- Eu tenho que ir - ele disse repentinamente e se levantou. Com passos rápidos, já estava fora do restaurante e em direção ao prédio onde trabalhava, um gosto amargo na boca e o coração apertado. Isso não estava certo. As pessoas não se aproximavam dessa forma. Principalmente ela. Claro que não, ela sempre esperaria os homens se aproximarem. E escolheria os falastrões, aqueles emgabeladores com suas frases baixas e de efeito. Nunca que uma garota daquelas chegaria e se abriria dessa forma para um homem, principalmente um homem como ele, sem qualquer atrativo. Não mesmo. Havia algo de muito errado e ele sentia, como sentia o chão nas solas dos sapatos, o levando para longe dela.

Mas, por outro lado, talvez ela fosse apenas uma garota diferente de todas as outras, uma em mil, que, por sorte da vida e do destino - sorte esta que sempre parecera estar ausente de sua vida - trabalhasse perto dele e almoçasse com ele todos os dias e o notasse e, impetuosamente - não, insanamente é a palavra exata - sentasse em sua mesa e pedisse para conhecê-lo. Ela poderia simplesmente ser uma garota... única.

Ou não, como Carlos perceberia ao voltar correndo ao restaurante, coração disparado e respiração ofegante, temendo ter perdido a chance de sua vida, e a visse tendo que pagar a duas outras amigas pela aposta que acabara de perder.

escrito por Chico Lacerda | 13:28 |


sexta-feira, março 14, 2003  

Chicago – Rob Marshall

Não sei se o padrão de escolha está muito baixo ou se eu estou me tornando chato e crítico demais, mas eu não consigo conceber como o filme Chicago recebeu o Globo de Ouro de melhor filme na categoria musical/comédia e ainda está indicado para o Oscar de melhor filme, além de vários outros prêmios ganhos. Não é que o filme seja simplesmente fraco, o caso é que ele é muito ruim.

Conta a história dessas duas mulheres que são presas: uma era estrela do Vaudeville e matou o marido e a irmã; a outra quer ser uma estrela do Vaudeville e matou o amante. Numa Chicago sedenta por notícias de crime, elas disputam e manipulam a opinião pública a seu próprio favor com a ajuda de um famoso advogado.

A história pareceu bem interessante no trailer, só que nada é desenvolvido no filme. Nem os crimes das mulheres, nem a exploração da opinião pública, nem a relação delas com o advogado, nem a rivalidade entre as duas. Tudo é mostrado de tal forma que parece que foi apenas narrado desinteressadamente, sem qualquer aprofundamento, análise ou aproximação com o espectador.

Se ainda fosse desculpa para bons números musicais - e eles estão em profusão no filme (os números musicais, não os bons números musicais) - até seria de alguma diversão, mas são números pífios, sem qualquer imaginação, a maioria apenas de canto – e mesmo assim simplórios - que contam apenas o que já foi dito antes no filme, sem fazer a história andar nem causar qualquer admiração. A única exceção parece ser o número que mostra os crimes das mulheres da ala dos assassinos, o que só prova a regra. E, além de tudo, eles estacionam o enredo, causando a partir de certo ponto apenas impaciência e destroçando qualquer tentativa de fluência ou ritmo no filme.

Tudo isso faz com que qualquer ponto positivo (a atuação de Renée Zellweger, a mise en scène) se torne irrelevante, pois ele não tem o básico para segurar uma narrativa cinematográfica padrão nem o básico para segurar um musical padrão. Que dirá para ganhar prêmio.


escrito por Chico Lacerda | 10:51 |


quinta-feira, março 13, 2003  

As Horas - Stephen Daldry

----- Original Message -----
From: "Luiz Francisco Lacerda" [lfl@hotlink.com.br]
To: [olharcritico@yahoogroups.com]
Sent: Wednesday, March 12, 2003 7:03 PM
Subject: Re: [olharcritico] The Hours

Vi ontem As Horas e posso entrar no jogo:

Gostei muito de Meryl Streep e Julianne Moore. Nicole Kidman tá massa na cena da estação mas meio merda no resto.

Quanto ao filme, achei-o maçante. A musiquinha não incomodou, mas às vezes entrava numas partes estranhas, onde parecia não haver necessidade de música, chamava atenção pra si.

Li o livro recentemente, e achei-o fraquinho. A adaptação enfraqueceu-o mais ainda, principalmente as personagens. No livro as três mulheres são mais complexas, enquanto o filme acentuou um aspecto de cada e esqueceu do resto: Virginia é a doida mórbida (foi a que mais perdeu), Laura é a deslocada (no livro ela não é muito mais que isso, mas tem um passado pra ajudar na construção) e Clarissa é a que quer reviver a felicidade do passado a qualquer custo.

Engraçado que eu vi recentemente o Adaptação, de Spike Jonze, que discute exatamente a adaptação de um livro complexo pro cinema, e até sugere essa abordagem de acentuar alguma coisa do livro em detrimento do resto. Mas no caso de As Horas o cara detonou as personagens, que são o que move a história.

Quanto ao ator mirim, ele se fodeu. Pegou uma personagem altamente não-pirralho pra fazer: um doido com fixação doentia na mãe. Mas ele era tão ruim que nem gritar com credibilidade conseguia.

No final, junto com a (não) profundidade das personagens, me ficou a incompetência do diretor em colocar em imagens coisas que no livro são lembranças e pensamentos. Tudo bem que ele não usou flash-back, que é uma solução bem simplista (e não iria ficar legal dentro da estrutura cronológica do filme de três tempos distintos em paralelo), mas, ao invés disso, colocou tudo nos diálogos, tornando-os muitas vezes irreais e ilógicos.

[]s,

Chico.

----- End of Forwarded Message -----

escrito por Chico Lacerda | 01:21 |


segunda-feira, março 03, 2003  

Adaptação - Spike Jonze

Como não fazia havia muito tempo, vou recomendar fortemente a quem não assistiu a este filme não ler o restante da resenha, sob o risco do filme perder grade parte de seu poder de admiração e surpresa. A resenha, portanto, não irá apresentar aspectos mais didáticos uma vez que, teoricamente, quem a estiver lendo já terá visto o filme. Isto dito:

A expectativa era muito grande depois de Quero Ser John Malkovich, primeiro filme de Spike Jonze, e o Adaptação conseguiu, com honras, preenchê-la e superá-la.

A primeira linha de tempo, a de Susan Orlean e John Laroche, é soberba ao nos apresentar dois personagens interessantes - cada um a seu modo - e os conflitos dela ao ter que encarar a falta de paixão de sua vida, depois de conhecê-lo. A segunda idem, com Charlie Kaufman tendo que rever todos os seus valores diante do fracasso no trabalho e na vida, após ler o livro de Susan e assistir ao supreedente sucesso de seu irmão gêmeo, em cima dos mesmos valores que ele desprezava.

Mas o gênio do filme está nas conexões entre essas mudanças. Se n'O Espelho, de Jafar Panahi, primeiro vemos um filme sobre um menina tentando chegar em casa e, após a ruptura, vemos um filme sobre a atriz principal da primeira parte - que revela-se um filme dentro do filme - tentando chegar em casa, ou seja, teoricamente a realidade, no Adaptação a mudança é inversa: primeiro vemos a realidade, um roteirista numa crise de identidade tentando infrutiferamente adaptar um livro complexo sem se vender aos ditames da indústria de Holywood. Depois de fracassos, frustrações e decepções, ele se rende a tudo que antes desprezava e, genial, o filme começa a mudar, não mais refletindo a realidade mas se tornando realmente um filme fruto de um roteirista medíocre de Hollywood, num rasgo originalísimo de metalinguagem. Afinal de contas, o personagem Charlie é, teoricamente, roteirista do filme que estamos vendo.

Diferentemente d'O Espelho, a ruptura é mais sutil, embora inegável. Pouco a pouco todos os clichês do cinemão, muitos citados anteriormente no filme como lixo, começam a aparecer: perseguições, tiros, batidas e mortes; lições morais; personagens encontrando a saída para seus problemas depois de frases reveladoras; personagens perdendo toda a sutileza e virando drogados assassinos; amores mal resolvidos se resolvendo magicamente; músicas alegres em finais felizes.

E foi fruto de muita coragem tomar esse caminho pois, para o público médio de cinema comercial, essa mudança no filme deve se mostrar apenas resultado de um filme já inicialmente ruim baseado num roteiro irregular. Já para um público mais exigente, que talvez estivesse se deliciando com os conflitos humanos de Susan e Charlie, o filme se torna péssimo, pois incorpora tudo que há de mais medíocre no cinema comercial. Mas é o preço a se pagar, meia hora de filme ruim, barato no final das contas, para se manter a lógica de um roteiro incrivelmente engenhoso e fonte para horas e horas de discussão sobre os mais variados temas, da manipulação da audiência ao uso da metalinguagem, do cinema assumidamente comercial ao cinema contrabandista, passando pelos valores e paixões que regem as vidas. E esse filme se mostra, acima de tudo, fruto de uma paixão: o Cinema.

escrito por Chico Lacerda | 17:23 |
 

A profundidade do som.
(Broken Social Scene – You Forgot It In People, 2002)


Detalhes fazem o diferencial de uma obra. Mesmo a falta de detalhes pode ser um detalhe importante. A paisagem no fundo da Monalisa é importante, senão essencial, para o conjunto do quadro. Proust não seria o mesmo sem as frases longas que definiram seu estilo de escrever. Enfim, em música pop não é muito diferente.

Uma canção de três acordes, em tese, não tem muito o que se detalhar. Mas o cara obcecado por música vai reparar cada instrumento, cada timbre, cada segundo da canção. O que o Broken Social Scene faz é basicamente isso: grandes canções pop, que impressionam pela simplicidade e ao mesmo tempo pela riqueza de detalhes.

E a fórmula nem é tão complexa assim. A banda tem uns dez integrantes, e entre eles há instrumentos incomuns em bandas de rock, como cordas e metais. Mas longe deles ser mais uma “rockestra” canadense, como o Godspeed You Black Emperor, com músicas longas e cheias de partes. O grande trunfo do BSS é unir essa pluralidade de instrumentos em função de canções breves com refrões poderosos.

Embora cada canção desse segundo álbum soe como uma banda diferente, e isso nem sempre seja um mérito, You Forgot It In People é, em sua maior parte, excelente. Tirando algumas canções instumentais - que mesmo não sendo de todo ruins parecem ter sido colocadas ali só para completar espaço – todas as faixas possuem alguma coisa especial. A segunda do disco, KC Accidental, tem um riff de guitarra simplório, mas vai crescendo até a calmaria da melodia vocal, dessa vez acompanhada de cello e violino, até terminar no mesmo tema do início. A terceira, Stars and Sons, repete uma linha de baixo do início ao fim, com a melodia sussurrada indicando as variações. Aos poucos os instrumentos vão entrando e ocupando cada um o seu espaço. A quarta, Almost Crimes, é o grande momento do disco, com a bateria acelerada, o baixo simples porém pesado, e o dueto de vocais no refrão. Lover’s Spit lembra o Mercury Rev dos últimos álbuns, e é o momento dramático do álbum, mas nem por isso menos empolgante. E Anthems For a Seventeen Year Old Girl é uma das coisas mais bizarras e pop que eu ouvi nos últimos meses.

Talvez esse seja o tipo de disco para se ouvir com fones de ouvido, dada a grandeza do som. Mas ele não faz feio em caixas de som regulares, já que as canções são quase todas acessíveis ao ouvinte desse tipo de música.

O engraçado é que no Canadá esse álbum foi elogiado por boa parte dos críticos de música, mas o BSS era praticamente desconhecido nos Estados Unidos (e, por tabela, no resto do mundo). Só depois que o zine Pitchfork falou deles é que começou-se a dar ouvidos ao conjunto (este que vos escreve foi um dos que teve a sorte de ler o zine nesse dia). Esse tipo de coisa me deixa um pouco paranóico. Até onde a gente vai ter que esperar que a música de outros países passe pelo filtro dos Estados Unidos para, então, se disseminar entre os ouvintes do resto do mundo?

Nota: 8,0

escrito por Haymone Neto | 04:22 |
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